A Revista Destaque Imobiliário do mês de abril trouxe texto do arquiteto Pablo José Vailatti, sobre possibilidades de se criar projetos e investimentos particulares que priorizem a cidade e os espaços públicos.
Qualidade para o espaço urbano
A cidade, como espaço de convívio e trocas sociais entre a comunidade depende diretamente da qualidade de seus espaços públicos para garantir a qualidade de vida de seus cidadãos, entre outras necessidades como transporte público, saneamento básico, preservação de seu patrimônio e praças urbanas, entre outros.
Nós, arquitetos, temos a obrigação de, a cada projeto desenvolvido, ao menos tentar transformar aquele espaço urbano, aquele bairro, aquela rua que estamos modificando, num espaço de melhor qualidade do que ele é hoje. Todo e qualquer projeto pode vir a proporcionar este benefício para a cidade, esta “gentileza urbana”.
Os projetos aqui apresentados são típicos do construtor particular, uma pessoa que opta por investir seu capital, não em poupança, ou outro fundo de investimento, mas sim na construção civil. Sem ter conhecimento específico para isto, ele passa a acompanhar o andamento de uma obra, pois esta obra é o seu investimento financeiro. Uns mais bem servidos de profissionais arquitetos, engenheiros e construtores, outros nem tanto, começam a construir algumas das paisagens da nossa cidade.
Temos que reconhecer que a grande maioria destes investimentos não qualifica o espaço urbano em que foi inserido. De fato, ele não foi pensado para isto, seu objetivo final e direto é o máximo aproveitamento do terreno para construção e seu lucro imediato. Esta vontade insaciável de lucro passa por cima dos interesses que deveriam nortear toda e qualquer construção, a melhoria do espaço urbano, ou seja, a qualificação do espaço da cidade.
Como exemplo de uma pequena contribuição a cidade, colaborando com a configuração do caráter deste bairro e destas ruas em que estão inseridos, estes dois projetos de pequenos conjuntos residenciais (um com 4 unidades e outro com apenas 3 unidades), projetados para as cidades de Penha e de Balneário Piçarras, ambas localizadas no litoral norte catarinense, buscam proporcionar algo novo para a cidade, um espaço de encontro, um local para lazer, para o ócio, para a contemplação. Uma pequena praça foi criada afim de qualificar este espaço da cidade, abrindo mão de uma fatia do terreno para um bem maior.
Esta pequena praça que certamente atrairá a atenção das crianças e famílias que ali por perto moram foi criada para a cidade, sem prejudicar o investidor, pois isto certamente valorizará este conjunto de casas.
Porém, sabemos da dificuldade dos incorporadores e investidores considerarem esta hipótese, de doar algo para o bem público, sem que isto lhe traga maiores lucros. Logicamente, esta é uma visão destruidora, um capitalismo selvagem, que não considera um investimento mais inteligente, mais adequado ao local, a nossa época e a nossa cidade.
A melhor ação que poderia ocorrer nestas e em outras cidades seria a criação de uma lei onde os investimentos imobiliários que ocupassem a esquina das quadras, fossem obrigados a deixar uma de suas laterais para uso público, buscando com isto proporcionar a cidade e as pessoas, a melhoria de seu espaço urbano através de investimentos particulares.
Também sabemos que este espaço residual, que seria abdicado pelo investidor, de forma alguma, abala o seu lucro final. Sim, ele continuaria construindo, movimentando a economia e juntamente com isto estaria espalhando pequenas praças por nossas cidades.
Será que podemos almejar construtores e investidores conscientes de que o seu papel dentro de uma sociedade é muito mais amplo do que apenas ter um empresa lucrativa?
Será que podemos esperar que estas construtores enxerguem que são responsáveis pela construção de nossas cidades e de nossas paisagens urbanas? … E que assim devem se comportar, sempre preocupados com o cenário urbano que criam seus investimentos, certos de que cada edifício é apenas uma parte de um todo muito maior que é a cidade, e que sempre deve ser priorizado.
Comentários
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Muito interessante. Realmente a arquitetura é uma ação social, podendo ou não cumprir seu dever. Tem um trecho do livro "Arquitetura Conversável", de Marcelo Ferraz, que fala sobre a parte projetada também significar o todo: "tampouco é pretensão dizer que o arquiteto 'desenha' o mundo. Mundinho ou mundão, não importa. O espaço envolvente é sempre um pedaço de mundo".
É muito legal ver que as pessoas ainda se importam…